POA 29.09.94[cartão]
Lucienne,querida:
Tenho chamado muito Rafael,para que verta o conteúdo de sua ânfora dourada em meu sangue,para purificá-lo.E nael,meu amigo particular,me protege sempre.A tal ponto que consegui transmutar o HIV numa coisa boa dentro de mim.Depois de quase morrer ando feliz agora.A emoção,estranhamente,parece "curada".Falo sempre de você(e me pergunto,e os livros?),mas nos últimos anos a vida me levou para lugares inimagináveis.Viajo dia 4 para a Europa mas,no final de novembro,estou de volta.
Não vamos nos perder.
Muito amor,seu
Caio F.

| Por Lara | 20.11.07 | 14:30.

[Noruega] 31.05.94 [cartão]
Déa querida:
Tô no sul da Noruega,depois de rodar bolsinha por Portugal,Espanha e Suécia.Voltei a Stockholm depois de 21 anos, foi emocionante.Te escrevo na sala de uma casa no meio de um jardim.De frente para um fjord.Ouvindo Callas e fumando horrores enquanto Augusto cuida de Evelyn,a gata castrada hoje,um escravinho norueguês loiríssimo corta a grama lá fora.Toda Laika tem seu dia de Stéphanie de Mônaco,baby.A vida me parece bela e mágica,mas morro de saudade de você: escolhi esse cartão a dedo.Chego em SP(medo!)dia 8.Quero te encontrar bela e tirana.Beijo

Caio F.

| Por Lara | | 14:29.

Berlim, 01.07.93 (cartão)
Luciano, meu querido:
sozinho no hotel, quase uma da manhã, no verão alemão, ouço Adriana C.no walkman e me dá uma saudade irracional de você.Que foi tão bom para mim nos dois meses de uma POA péssima.Nenhum calor.Perdi POA, perdi SP, talvez tenha perdido também o Brasil, me chamam para a Hungria e Indonésia, arrumo/desarrumo malas por hotéis estranhos,choro em Veneza, beijo turcos em Milão, acho graça em clichês, rio com Rubem Fonseca,falo duas palavras em inglês, uma alemã, outra italiana, três francesas, outras cinco portuguesas, e não tenho mais uma vida ¨normal¨.Malas, hotéis. E os amigos, cadê? Você foi lindo comigo. E distante. Me deu apoio,não o ombro. Queria tanto ter chorado a dor enorme de POA e a velhice dos meus pais no Menino Deus no ombro de um amigo. Não temos tempo: somos maduros.
Onde será que isso começa? Procuro o fio, há só a meada.
Te abraço quente e longe. Quais eram nossas esperanças?
Recomendações a Luiz Fischer (lindo), please, e fique com Deus.
Te beijo, irmão.
Caio F.

| Por Lara | | 14:27.

Berlim 01.07.93 (cartão)
Adriana C.
Minha sempre deusa, continuo andando pelo mundo, chorando ao telefone, prestando muita atenção, divertindo gente, a fome dos meninos da Yogoslávia nas ruas ricas da West-Berlim dói tanto ou mais quanto os nigrinhos do Rio, há dez meses acordo e não tenho ninguém do lado - os meus amigos, cadê? - Vou/irei à Tchecoslováquia, talvez Hungria, Jakarta, mas perdi alguma coisa no Brasil, ¨à tarde Maria dorme¨, tenho medo, matam turcos e a estrada é enorme, mas tua voz e tua música me aconchegam entre Paris/Amesterdam/Berlim/Praga/London/ tudo é muito igual e belos os alemãezinhos ao sol do verão fugaz deles.Te mando retalhos de amor.
Caio F.

| Por Lara | | 14:25.

Porto Alegre, 26 de agosto de 1983
Levinha, querida,
depois de 10 anos de proibição pela censura,saiu,vai aí o programa.Sou suspeito,claro,mas acho lindo.Tem tido casa cheia toda noite,crítica boa,aplausos em pé,aquelas coisas.Ando comovido e feliz.Vim pra estréia,aí recebi tanto carinho que fui ficando até hoje.Só volto pro Rio dia 5.Aproveito e mando,no fim da carta,o endereço de lá.Tá tudo indo bem.Minha cabeça melhorou demais com a saída de Sampa.Estou mergulhado na revisão das últimas provas do livro novo,o O Triângulo das águas, três novelas que chamo de "noturnos", a sair em outubro pela Nova Fronteira.Tem várias homenagens,uma delas a você...Reticências de suspense!Escrevo meio na corrida,pra aproveitar um embalinho de saudade forte.Outra noite em Gramado,falei horas sobre você.Mê de notícias,pro Rio ou pra cá(o fone daqui é 0512-33-4197).Dá um beijo em Murilo e um abraço nos guris.Diga,por favor,a Bel que penso nela com freqüência e mando nice vibes.Que você esteja feliz,em paz,produzindo.
Todo o carinho do seu velho

Caio F.
(o primo intelectualizado de Christiane)

| Por Lara | | 14:23.

Sampa, 16 de fevereiro de 1981.
Bruna,
amei seu livro (Gaia).Estive doente, há umas duas semanas (um vírus misterioso, pestes soltas no ar, na água desta cidade infernal),e aproveitei para ler uma porção de coisas guardadas há tempo. Acho corajoso, bonito, forte. Principalmente quando você solta o emocional. Várias vezes,me comovi, li em voz alta para os amigos, para mim mesmo. Gostava, e muito, do primeiro, mas acho que você cresceu ainda mais. E na direção certa.
Queria dizer isso a você. Por favor não se abale com as maldades tipo Lèo Gilson(crítico literário).Não deixe que esse tipo de comentário, mesquinho e destrutivo, bloqueie a sua criatividade. Está tudo muito ruim,e nós precisamos mais do que nunca ser solidários uns com os outros. Trocar estímulos.

Assim: olha, eu sei que o barco tá furado e sei que você também sabe, mas queria te dizer pra não parar de remar, porque te ver remando me dá vontade de não querer parar também.

Tá me entendendo? Eu sei que sim.Qualquer coisa, conte comigo. Sem conhecê-la profundamente - mas mais pelo que você escreve e menos pela sua imagem pública - te quero muito bem. Estou com você e não abro.
Receba um beijo grande.
Seu amigo
Caio Fernando Abreu

| Por Lara | | 14:19.